Os preços de alimentos e bebidas tendem a continuar pressionando o orçamento das famílias brasileiras neste ano. Nos últimos 12 meses até janeiro, os itens ficaram 8,92% mais caros em Campo Grande, superando a média geral de 4,60%, conforme o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
De acordo com os especialistas ouvidos pelo Correio do Estado, a tendência é de que o peso da alimentação no bolso do consumidor fique ainda maior este ano. O doutor em Economia Michel Constantino acredita que o cenário deve permanecer negativo.
“O cenário é bem negativo, e o bem-estar da população só tende a piorar, pois não enxergamos atitudes do governo para reduzir seus gastos. A confiança do consumidor vem caindo vertiginosamente”, avalia.
Entre os fatores que aceleraram esse cenário de maior peso da alimentação nos lares brasileiros, os efeitos climáticos podem intensificar o impacto nas carnes bovinas e de aves.
O mestre em Economia Eugênio Pavão corrobora com a avaliação e acredita que, depois da alta de café e ovos, outros alimentos ficarão mais caros.
“O quadro para 2025 é de aumentos de alguns produtos, principalmente os que dependem da natureza, como horticultura, frutas e grãos, além dos produtos exportados, que vão reduzir a oferta interna e desfavorecer o mercado interno, tais como ovo, café, arroz e carnes”.
Dados do IPCA, medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam que, em Campo Grande, cortes bovinos subiram mais de 30%, a carne suína, 17,87%, o frango, 10,78%, o óleo de soja, 18,86%, e o café moído, o grande “vilão”, teve aumento de 52,74% no período de 12 meses até janeiro.
Para o economista Eduardo Matos, a principal dificuldade é que muitos itens que já são substitutos têm aumentado.
“Itens substitutos de menor valor, como é o caso do ovo, que substitui a proteína animal e o frango, que também é um substituto da carne vermelha, já estão mais caros e com a tendência de subir ainda mais. Não tem muito para onde correr, por assim dizer”.
RENDA
Estudo conduzido pelo economista André Braz, da Fundação Getulio Vargas (FGV), publicado pelo jornal O Globo, revela que o peso dos itens básicos no orçamento das famílias brasileiras tem impactado sobretudo as de menor poder aquisitivo.
Segundo a análise, o consumo de alimentos já compromete 22,61% da renda das famílias que ganham entre 1 e 1,5 salário mínimo (R$ 1.518 a R$ 2.277) – um salto expressivo em comparação aos 18,44% registrados em janeiro de 2018. Mesmo com o salário mínimo já fixado em R$ 1.518, a escalada dos preços tem limitado o poder de compra desses lares.
Desde o início de 2020, os preços dos alimentos para consumo doméstico acumulam alta de 55,87%, muito acima da inflação oficial medida pelo IPCA no período, que ficou em 33,46%.
O avanço expressivo dos custos reforça a pressão sobre os orçamentos familiares, evidenciando um cenário de dificuldades crescentes para garantir itens essenciais à mesa.
“As pessoas de baixa renda sofrem mais com a inflação, têm dificuldades financeiras e pouco acesso a empréstimos. Para dar conta das despesas familiares, o salário mínimo é insuficiente e, com a alta dos gastos com produtos necessários, a opção dos mais necessitados é substituir produtos por outros mais baratos, aproveitar promoções ou fazer compras em grupo”, indica Pavão.
Matos reitera que a população mais vulnerável economicamente é aquela que sofre mais.
“Isso porque grande parte da renda da população mais pobre é destinada ao consumo, principalmente, ao consumo de alimentos, enquanto a propensão a poupar é exclusiva dos mais ricos. Temos um cenário em que a inflação de alimentos, de fato, vai onerar mais aquelas famílias mais pobres”.
Apesar de as famílias de baixa renda sentirem mais, as famílias brasileiras de todas as classes sociais notaram a elevação de preços dos alimentos e das contas de água e energia elétrica, conforme pesquisa Quaest divulgada no dia 16.
Conforme o levantamento, 8 em cada 10 entrevistados dizem que preço dos alimentos subiu. A percepção é praticamente semelhante entre as classes sociais. Os preços mais baixos foram citados por menos de 10% de todas as faixas de renda. Já a percepção de estabilidade varia entre 11% (classe baixa) e 14% (classe
alta).
ESTRATÉGIAS
Quanto às estratégias para amenizar o impacto da inflação dos alimentos, os economistas apontam que é possível tentar aumentar a renda ou substituir produtos ou marcas para reduzir o impacto das altas.
“Aquelas famílias que têm um aperto maior em sua renda, que têm uma renda mais limitada, devem optar sempre pela pesquisa de mercado, buscar aqueles supermercados ou atacarejos que ofertam um produto mais em conta. Agora não é o momento de prezar por marcas. Nesse momento, é hora de organizar as finanças e buscar simplesmente comer. É sempre interessante buscar pela otimização da renda”, considera Matos.
Constantino aponta que o aumento dos preços está generalizado na cesta de consumo e o poder de compra está caindo a cada mês.
“Para amenizar essa dinâmica, temos três caminhos: os ajustes naturais que as famílias fazem no orçamento, e com esse nível de aumento o efeito é quase zero; o governo ajustando de verdade as contas públicas para reduzir a pressão inflacionária; e as famílias buscando aumento da renda com atividades alternativas”.
Para este ano, o mercado já precificou a inflação muito acima da meta estipulada pelo governo, segundo dados divulgados nesta segunda-feira no Relatório Focus, do Banco Central. A projeção para este ano passou de 5,60% para 5,65%, enquanto, para 2026, a estimativa subiu de 4,35% para 4,40%.
“Uma inflação que beira os 6% é bastante elevada, então, para 2025, a tendência não é de melhora, na verdade, a tendência é de piora. Os próximos meses podem ser decisivos para a economia brasileira, principalmente do ponto de vista macro. Isso porque o mercado assimilou as últimas decisões apontadas pelo Copom da taxa de juros, mas ainda não há sinais de recuperação. Para 2025, realmente o cenário não é positivo”, finaliza Matos.